quarta-feira, 10 de junho de 2015

[leituras] Nós

Título: Nós
Autor: Yevgeny Zamiatine
Páginas: 274
Ano: 1921

A distopia que ninguém conhece. Muitos ais e uis com 1984, com Clockwork Orange, com Admirável Mundo Novo e o pobre do Zamiatine fica a um canto. Eu de alguma maneira conhecia o nome, não sei se o vi algures ou como é que me apareceu nos registos mas de nome conhecia mas de resto, assumo a minha ignorância. Mas de há uns tempos para cá tinha este Nós na lista de a ler com alguma urgência pela curiosidade que me despertava.

Na parte de trás do livro bem que é dito que foi um livro que inspirou o 1984 e verdade seja dita que no início a ideia com que fiquei foi que seria uma mistura de 1984 com Flatland, quase como se os tivessem metido num saco, baralhado e quando foram a ver o resultado saiu este Nós. Depois esta ideia dissolveu-se sem problemas mas nos primeiros capítulos não houve grande escapatória.

Depois o livro em si é mais sciency, ou seja, tenta dar-nos muito mais uma perspectiva do lado mais numérico da coisa, mais dentro do que está a acontecer cientificamente do que propriamente só uma passagem superficial a contar que se passam coisas. 

E como já seria de esperar entramos em mais um mundo estranho e assustador. Aqui as pessoas são ainda mais mecânicas do que no 1984. Aí as coisas eram muito vigiadas, tudo, mas aqui toda a gente faz as mesmas coisas, tudo tem horas, Hora de Acordar, Hora de Comer, Hora Sexual, Hora Pessoal. e é esta última - que até nos dizem que nem faz muito sentido - que tem as últimas duas horas "livres" do dia para esta gente. Tudo o resto é controlado, tudo o resto está contabilizado ao máximo. E mais: tudo tem de estar racionalizado, completamente, o amor é racional também, quase apenas mais uma equação ou uma fórmula qualquer. Máquinas, não há outra palavra para isto. 

E atenção que não há pessoas, há números. Esta ideia é aterrorizadora, faz-me umas comichões indescritíveis! 

É engraçado de ver que quando nasce algum tipo de dúvida sobre o que se passa, algum pensamento próprio sem ser completamente fabricado e artificial nasce o sonho. O sonho é considerado um grão de areia no cérebro, quando a engrenagem tem lá qualquer coisa a mais, nasce o sonho. Esta ideia é mais bonita do que me apercebi a início, embora no mundo representado seja uma coisa má. 

Outro ponto que é mais frisado a início e que com o desenvolver do livro se perde um pouco é a noção do narrador de para quem é que está a escrever: para o passado. É uma ideia absolutamente genial que me fez parar um pouco para bater palmas ao Sr. Zamiatine. A noção de que há coisas que precisam de ser explicadas a alguém do passado porque provavelmente não conhece as bases daquilo em que vivem naquele momento é muito bom e é bem explorado.

No meio disto tudo eu gostei imenso da história mas achei-a confusa, ou melhor, a construção da história tem alguns pormenores que aparecem de forma estranha, muito brusca, muito caído do céu e deixa o leitor ligeiramente perdido com o que se está a passar. Geralmente consegue-se perceber uma boa parte com o contexto seguinte (não precisa de ser nas páginas a seguir, às vezes é só com o desenvolvimento mais a fundo da história) mas ainda assim cria um ambiente de confusão que nos liga à personagem principal, que se sente um pouco como nós, mas onde acabamos por estar sem saber muito bem o que se está a passar. Não é que seja péssimo, obriga-nos a prestar atenção e a investigar mais na entrelinhas o que se está a fazer mas durante uns capítulos ficamos muito sem explicação do que se passa e porque raio acontecem tantas coisas sem sentido - algumas cheguei ao fim do livro sem perceber.

Mas a ideia é muito boa, ainda assim gostei mais das outras distopias que já li, achei-as mais construídas e com uma escrita melhor mas sem dúvida que gosto muito deste livro. 

Além do mais: Antígona! É mais uma das editoras que me faz chorar por não sr rica, tem edições absolutamente geniais e lindíssimas e esta é uma que gosto imenso, uma imagem muito simples mas muito boa!

Venham mais coisas destas, assim vale a pena!







4 comentários:

  1. Quem é que aconselhou quem foi?

    Zamiatine tem o defeito de ser antigo... Tivesse ele nascido umas décadas depois, e "Nós" era a melhor distopia!

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    1. É verdade, tenho uma boa fonte de conhecimento! E sim, isto é muito bom! Tem algumas cenas muito hardcore, fazem aquela comichão cerebral de "E se se lembram de arranjar uma tralha destas?"

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    2. Yes, creepy is the name... E não precisa de ultra-violência, como o Clockwork Orange, para isso!

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    3. Eu até estou com algum medo de ler o livro. Já sei que tem cenas mais hardcore do que o filme.. Tenho algum receio mas deve ser qualquer coisa de muito bom. Tanto aqui como no 1984 isto faz imensa confusão mas é pelo perceberes o que o mundo é. É o pensares naquela realidade como realidade.. Isso é que me atrofia completamente!

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